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Hélia, Helena, Heloísa... não.
“H.” só pode ser abreviação de holocausto! Porque em toda a história da
historiografia nunca jamais houve garota mais azarada. Humilhada, talvez lhe fosse
o nome. Mas nem aqui, nem no Haiti pude me deparar com garota tão odiada pelo
horóscopo.
Órfã de pai e mãe, a vida lhe pegou de
um jeito horrendo. Das lembranças, só sobraram os hematomas. Não sei se a pobre
habitante daquele apartamento com aquele tanto de bichanos poderia sobreviver a
tamanha humilhação vinda da própria vida.
As tias que lhe acolheram não passavam
de duas hipócritas. Não hesitavam em desviar os poucos mil-réis de seu pai
deixara de herança. E no domingo estavam santas e puras tomando a hóstia. H.
não podia mais viver nesse ambiente herético! Mal podia cometer um mero deslize
que já era tido como hediondo, por mais inofensivo que fosse – e logo pegavam o
hissope para aspergir-lhe água benta. A hóspede, inconformada, deu um basta com
a chegada da maioridade. Sabia pois, que era a herdeira de direito.
Não podendo manter aquela habitação
sozinha, H. decide arranjar um trabalho. Escolheu conviver com hidrângeas, hortênsias
e heléboros. Serve chá de hortelã aos clientes que a procuram para honrar seus
mortos. Ao cair noite, quando sol se põe no horizonte, ela volta para casa
cantarolando, num hilário descompasso, um hino harmonioso. H. assim cumpre seu
horário, de modo religioso e hebdomadário.
E é em seu apartamento, universo quase que
hermético, que nossa heroína põe-se a lamentar sobre a própria história. O que
é hesterno, a H. pouco lhe importa. Vive do que for hodierno e aguarda o futuro
sem histeria ou ansiedade – para uma moça que vive sem pressa, a vida acontece em
doses homeopáticas.