Quem sou eu

Minha foto
86400 segundos/dia em busca de respostas. ignorance is bliss

a caixa

Aí uma hora lá meu professor me perguntou de minhas ambições para o futuro. Menti. E tô deprimida desde então.
Aí escrevo. Desligo os alarmes dos despertadores, atraso as horas do relógio de pulso e finjo que tenho tempo para isso.
Insistem em colocar-me numa caixa. Minha essência, meus sentidos, o que me faz ser eu, e também o que hei de ser, foram soltos quando abriram aquela de Pandora - e não há volta. Mas insistem.
Padronizam-me, comprimem-me, Times New Roman, tamanho 12, espaçamento 1,5.

Os pés já doem, as unhas se encravam, os calos apertam - já não suportam mais fazer o caminho forçado, desviar daquele que os chama.
E os lábios se cerram. O bom e sonoro "não" dá lugar ao suspiro conivente.
As bocas alheias soltam "bravos!", mas e eu? As mãos se encolhem no aplauso, é impossível desnudar os dentes, é impossível ser sincero. Não é.
E não sou eu quem lhe falo, não sou eu que materializo essas palavras no papel cetim. Ponha a culpa na tinta, não no punho.

No meio do caminho eu estava e eu era a pedra. Na pedra do caminho eu estava e o meio era eu. No caminho das pedras eu tentei me encontrar e parei bem no meio. Desisti? Não sei. Não sei se vou, se fico, se prossigo na caminhada rumo ao incerto.
Então escrevo.
Escrevo pois não há céu nem inferno. Não sinalizam o caminho para o lado certo, talvez o oposto seja a melhor escol(h)a do viajante. Diga: "Não", mas falo "trinta e três", e até hoje não entendo porque sofro de asma.

O dever me chama, o alarme apita, mas eu tinha desligado, sei que tinha. O cobrador bate à porta e eu não tenho cartão de crédito - vida injusta essa para os pobres correntistas dessa maré sem placas, sem mapas, sem cartas. Ele bate na porta mas é minha cabeça que dói.
O que o futuro lhe reserva, o que serás quando crescer? Ó, relógio infeliz, cale a boca e me faça feliz.
Não há tempo, há trabalho, sei que há. Não existem respostas, porém - a vida não é tabuada.

Diga não, menina burra. Diga não. Palavra simples de três letras mas que cabe o fim e o início. Talvez seja nela que eu me caiba, não na caixa que insistem em me abrigar.
A tinta vai se acabando tal como as folhas do caderno preto, tal como os cabelos lisos da menina burra, da menina que não sabe dizer não, da menina que escreve sonhos com nanquim, mas mente sobre eles com os lábios.
O que foi dito o vento leva... E o escrito?
_____________________________________________________________LT

H. (2ª versão)






H.

H. morava sozinha com 17 gatos. Tinha amor por animais mais que por humanos, portanto não poderia desfazer-se de cada novo bichano que nascia. Os gatos davam à H. a sensação de responsabilidade, pois aqueles viam na moça alguém a quem depender – e ela gostava de ser dependida. Órfã de pai e mãe, teve de amadurecer muito cedo. Sua mãe, que sofria de depressão, tirou a própria vida com uma tesoura de costura, quando H. ainda aprendia as primeiras palavras. Uma tia disse que ela lia coisas depressivas demais. Já a outra dizia que era o pai de H. que lhe fazia sofrer.  H. não achava nem uma coisa, nem outra. Estava certa de que a culpa era dela.
O pai, Sr. A. Frederico, homem de influência na cidade por causa de seu ofício no banco, foi assassinado na porta de casa, mais precisamente aos pés descalços de H. Logo no momento em que ela já havia se acostumado com ele. Era um bom homem, afinal. Sempre trazia a H. uma bala de anis ao fim do expediente, mais algumas folhas de rascunho do escritório. Aos domingos, ia à missa das 7h com a menina. Fumava um charuto pontualmente às 8h. Mas suas mãos nas delas e suas feições às suas eram tão frias quanto uma manhã de inverno. O sangue não lhe assustara. Apenas o som estridente do disparo que lhe zumbe até hoje nos ouvidos.
As tias vieram assim que souberam da morte do cunhado. Não restando mais nenhuma opção, H. teria de partir para a capital com elas. Tudo parecia já estar planejado. No singelo apartamento do subúrbio, havia um quarto só para ela, com lençóis e fronhas bordados de rosas, terço pendurado na cabeceira da cama, Bíblia aberta no salmo 90 e uma imagem de Santa Clara de Assis no criado mudo.
As tias, carolas e puritanas, observavam minuciosamente cada passo que H. dava, à espera de um deslize. Seus deslizes, ainda que insignificantes, eram reparados com os joelhos no milho. H. não podia ter amigos. Não podia ter animais de estimação. Não podia sair sozinha. Não podia ver televisão. Não podia sair de casa sem antes rezar o terço. Não podia... não podia.
No entanto, H. nunca demonstrou fraqueza ante as agruras que a vida lhe apresentava. Era, porém, calculista. Como os gatos, agia com cautela, silêncio e estratégica rapidez. Dezoito era o número que precisava para dar adeus ao uniforme do colégio das irmãs marcelinas, aos joelhos machucados, aos lábios cerrados, à rotina mecânica. Num golpe de mestre, assumiu a pensão que recebia do pai, antes controlada pelas tias e, sem dizer adeus, foi à procura de um lugar para tocar a própria vida. Sem depender de ninguém.
Até que viu Frederico na rua. O próprio indicou-lhe o caminho. Parou no pórtico de um prédio no centro. Tinha certeza de que não poderia pagar o aluguel de um apartamento naquele local. Mas o gato convidou H. a entrar. Apenas um apartamento estava disponível – no sétimo andar. A senhora de 82 anos ficara viúva e os filhos decidiram mandá-la a um asilo. Foi a primeira vez que H. demonstrou genuína simpatia a outro ser humano. Ela prometeu fazer-lhe um preço melhor caso ficasse com sua gata, Georgeana. Fecharam o aluguel pelo preço de uma quitinete na zona sul. H. não poderia estar mais satisfeita. Mas não poderia dar-se ao luxo de arcar com todas as despesas apenas com o que seu pai lhe deixara. Vestiu o seu único vestido de seda e partiu em busca de um emprego.
Em seu caminho para a estação central, ouve a conversa de um casal de senhores, reclamando por não poderem conciliar os compromissos com os afazeres de sua loja. Ele dizia que tinha de resolver vários assuntos burocráticos referentes à loja. Ela dizia ser desculpa dele para que só ela trabalhasse. O decidido foi que contratariam um auxiliar. “Mas quem iria demonstrar interesse em trabalhar num cemitério”? indagou a senhora. E numa voz rouca e quase inaudível, H. solta um simples e direto: “Eu”. Seguiram, pois, os três, para a mesma direção. Pegaram o transporte que conduziria ao local e no trajeto conversavam sobre as condições de trabalho. H. logo se familiarizou com o cheiro das flores. Aquele foi seu primeiro dia de trabalho. De 10h às 17h30, limpar a loja e recepcionar os clientes.
E é assim sua rotina de segunda a sábado, além do Dia de Finados, que por sinal, é seu aniversário.
Ela não sabia se era feliz. Apenas vivia um dia após o outro. Mas ainda lhe restava um desejo para aquela vida despreocupada com o amanhã. H. gostaria de poder escrever – não romances, ou crônicas, ou talvez poesia –, ela gostaria de poder escrever um novo roteiro para a própria história. Mas toda noite, quando iniciava mais um “era uma vez...” os olhos cansados já pesavam as pálpebras... e H. adormecia.


H.


Havia 17 gatos vivendo no apartamento de H.
17, já que o gato mais velho que completava os 18 acabara de morrer. E H. está enlutada desde então. Todo dia às 9h acende uma vela a São Francisco. Diz que os 17 não suprem a falta que Frederico lhe faz. Mas ainda acho que isso ela diria de cada um deles. Ainda mais se fosse de Georgeana, a gata que junto com Frederico dera à luz a todo o restante da bichanada. No entanto, mesmo com Georgeana e os outros 16, H. ainda se sentia só.

Ficou órfã muito cedo. Morou com duas tias solteironas até atingir a maioridade. Aos 18 mudou-se para o centro e já podia se sustentar com o que ganhava como auxiliar em uma floricultura do cemitério local. Bem, ela podia ser jovem, mas não era tola. Apesar de ter seus lutos e traumas, escolhera conviver com quem partilhasse da sina de ter de sofrer a dor da perda. Sua vida cheira a crisântemo e vela de sétimo dia.

Aos clientes que entravam na loja, viúvas, pais e mães inconsolados e órfãos, como ela, H. servia uma xícara de chá de camomila com uma colherinha de açúcar refinado, para tentar adoçar-lhes a amargura das lágrimas. Quando entrava uma moça que também perdera os pais, H. oferecia um botão de rosa branca, por sua conta. Queria ter tido a chance de enterrar a mãe. Era muito pequena na ocasião de sua morte. Mas o antigo perfume que sentia em seu abraço ainda permanecia preso no olfato da memória.
Frederico era o nome do meio de seu pai. Por isso, no enterro do gato, sentiu cumprido o seu dever.

No fim do dia, H. volta ao seu refúgio. Dá de comer aos gatos, lava as louças, põe-se à mesa para jantar. Às 19h, senta-se à janela e, observando o mundo lá fora, imagina novas possibilidades para sua própria história. Até que o último "e se..." a faça adormecer.


Estiagem

04 de julho de 2013



E a vida parece um rio que tornou a secar

Não há combustível que faça a caneta derramar sua tinta

Não há remédio que consiga desatrofiar os punhos

-Aliás,

Não há remédio que eu possa comprar.

E aí, quando tento romper esse intervalo,
Livrar minha vida desse hiato,
As nuvens começam a se formar no céu.

Cada pingo nutre uma raiz de esperança que renasce no peito.
- Mas é chuva de verão... passa logo.

E a poça que se forma na terra seca do velho rio apenas convida a tinta para um encontro sazonal com o papel.

A ida ao nutricionista

20/05/13
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E mais de 1 mês após o American Dream, cá estou. 5kg acima do meu peso ideal.
A "dona..." - não, não revelarei um de meus milhares de apelidos de gorda com os quais minha família adora me atormentar! - resolve dar um jeito nisso e vai ao nutricionista.
Chego na clínica às 18h.
Mas... onde é que estou mesmo? Ah sim, no Brasil, então só vou ser atendida às 20h40. E nesse meio tempo, a covardia começa.
Enquanto dou umas tossidas para disfarçar os roncos do estômago, sinto o cheiro que sai da freaking pizzaria a poucos metros daqui. A fome aperta. Olho para o teto, e num suspiro momentâneo, visualizo frangos assados, coxinhas, pastéis, tortas e outras gordices flutuando no ar. Alguém bate a porta com força e eu "acordo" - chocada - do meu devaneio.
A consciência, aquela velha amiga sincera, me diz: "Tu não tem jeito, né, guria!? Pode ir, pode consultar o nutricionista, fazer dietinha e tudo mais... Adianta? Tua alma é gorda, menina!"
Entristeço-me com a triste realidade - e com a redundância da sentença.
Meu estômago grita: "Mas eu estou com FOME, oras bolas! Dane-se! Passe direto no drive-thru quando sairmos daqui! Pelo tanto que esperei acho que eu mereço, né?!"
Quase caindo na lábia do estômago, me conscientizo: "Shhhh!!! Cale a boca! A tentação, a irmã megera da consciência, está querendo te persuadir! Hoje começa uma vida nova! Mais saúde, mais hábitos saudáveis, mais exercícios, mais massa magra, mais imunidade, mais... mais... - em prantos - mais gosto de isopor, mais dores no estômago, mais água na boca, mais amargura, mais... AAAHHH! Lorena! Acorda! Hora do detox! Xô pensamento de gorda!"
Finalmente ouço a voz do doutor:
"Sra Lorena T Timo!"
O estômago geme. Respiro fundo... E sigo para o consultório sem olhar pra trás.
E depois da sabatina, do falatório, dos esporros e das falsas promessas, saio jubilosa - e faminta - da clínica, disposta a mudar.
Graças a Deus o que tinha em minha carteira me impossibilitava de dar ouvidos ao meu estômago fast-foodiano.
Passo reto das lanchonetes, dos mercados, dos restaurantes e das barraquinhas de cachorro-quente.
Chego em casa com o sabor da vitória nos lábios - que por sinal não era tão saboroso quanto ao da lasanha que estava na geladeira.
É então que eu olho para o fogão e a vejo como num reencontro entre velhas amigas:
A boa e velha sopa. Benzadeus eu tenho vó.
Tomei a sopinha sem reclamar. Mas não vou negar: Convidei o pão sovado para acompanhar... cê sabe né, para fazer aquela "despedida" dos meus amigos carboidratos...

Vida nova.
Alma magra.
Mas o apelido de gordinha... Ah, esse nunca me abandona... :(

LT

Gripe



Hoje no Café eu vou de chá
Hoje meu drops é pastilha de menta
Meu tira-gosto é o gosto amargo do anti-inflamatório
Para acompanhar, anti-alérgicos
Para adoçar, mel e própolis
Do guardanapo, escolho o lenço
Do silêncio, a tosse
Da inspiração, espirros
Para testar a gentileza humana, "saúde!"
Para o apelo divino, "amém!"
A trilha sonora... Compassos melódicos entre fungadas e pigarros
Para o corpo, a nova estação
Que com o clima não tem harmonia
Para o poeta, o ócio
Que até na gripe vê poesia.

LT
25/04/2013





De volta à rotina

Hoje quando acordei do velho travesseiro
Com o som do velho despertador
Lavando o rosto com a mesma água fria
Vi que voltei à rotina do bocejo e das olheiras

Quando vesti a velha calça jeans
Quando pus na bolsa os velhos livros
E ajustei o relógio ao horário local
Voltei à rotina do passo apressado e dos ombros doídos

Aí entrei no velho carro
Peguei a linha do velho ônibus
Cheguei na velha Universidade
Tomei o [bom e] velho café com biscoitos
E vi que voltei à rotina da azia e má digestão

Foi quando os velhos mosquitos me deram as boas-vindas
Bati o joelho na quina do velho banco
Por causa dos que passavam, calei meu "ai"
E quando peguei o caderno e a caneta
Percebi que voltara à rotina dos roxos, picadas e silêncio exprimidos nos rabiscos

E quando vi o céu coberto de neblina no Norte
E o céu azul sem nuvens no Sul
Quando vesti o casaco há minutos atrás
E senti calor na meia hora seguinte
Quando percebo que o céu começa a se anuviar
E encontro-me sem guarda-chuva
Vejo que voltei à rotina da incerteza

Olho pra carteira, o dinheiro é novo
Conto o troco do café
Faço contas na agenda
Retomo as velhas transações bancárias
E percebo que retorno à rotina do racionamento

Avisto então as velhas pessoas
As que cumprimentam por educação,
As que fingem que não vêem,
As que têm sorrisos sinceros,
As que desconhecem o sorrir
E então reconheço a rotina das convenções sociais

Quando olho para as paredes
E as comparo com as que vi dias atrás
Quando bebo meu café
E o comparo ao gosto que senti em outra longitude
Quando cumprimento as pessoas
E as comparo com os rostos novos de outra latitude
Percebo que voltei à rotina da nostalgia

E quando penso em voltar
Quando penso em beber o tal café
E rever as novas pessoas
Quando me imagino naquela estação
Esperando novamente pelo trem do destino
Quando olho pro que vivo e lembro-me de que pode haver mais
Enfim percebo que voltei à rotina dos sonhos

Enfim percebo que voltei à rotina de ser eu.


Diário de Bordo 4 - Os Sonhos Mudos

March, 19th
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Hoje a neve voltou, surpreendendo a todos... Quando eu pensava que daqui a poucos dias não precisaria mais de vestir duas calças, duas meias, botas, luvas e casacos pesados... A neve volta, desafiando nossa rotina.

E eu, correndo pra pegar o metrô, já sabia que iria me atrasar.
Paro num café para a primeira refeição do dia. Terei de esperar o segundo horário mesmo...
Para poupar-me as soletrações, aqui me chamo "Laura" (que na pronúncia local é "Lóra"). Peço o bom e velho capuccino e umas tostadas para acompanhar. Subo as escadas, e lá está ele: o local perfeito para a mente fluir. A mesinha redonda, que mal cabe o caderno, bem rente à janela que me apresenta uma bela vista do dia anevoado.

E enquanto beberico meu café quente, observo a neve cair de encontro ao vidro, vejo as máquinas na rua desobstruindo a passagem que a neve tomou, admiro os telhados dos prédios de tijolinhos vermelhos de Harvard, cobertos desse "algodão de gelo", as pessoas apressadas e empacotadas saindo da estação de metrô... Ouço os burburinhos da mesa ao lado, a música folk tocando ao fundo...

E penso: "Meu Deus... será que eu mereço mesmo tudo isso?"
E admito, constrangida: "Sabe, Senhor... isso aqui é muito mais do que tudo que eu já pedi".

Fico feliz o dia todo, pois confirmo que Ele escuta sempre... Mesmo os sonhos mudos mais escondidos em nosso coração...


Diário de Bordo 3 - How much???

March 1st
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- Então tudo se resume a isso agora?

Se você nunca foi aos EUA, nada que eu te contar fará sentido: Só mesmo VIVENDO essa experiência. Isso eu digo porque as pessoas já diziam isso pra mim, mas eu pensava: "Não... não é possível. Não é esse exagero todo!"

Mas eu digo, queridos: É ainda pior do que eu imaginava. O comércio norte-americano não cria apenas o desejo; ele cria a NECESSIDADE LOUCA de TER.
Se você não se controlar, não ponderar, não deixar a voz da consciência falar mais alto, meu querido, você roda.
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March, 15th

Isso eu disse um dia antes de ir pra uma outlet.

É, caros amigos....

Já rodei.




Diário de Bordo 2 - Impressões

01/03/2013
Hingham, MA
7:13 a.m.
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Depois de uma tarde/noite no shopping, cheguei em casa, dormi e here I am.
Cedinho, tomei café num Starbucks e ao longo do caminho tive as visões mais de contos de fadas que já tive na vida. Cenários de shoppings quando é época de Natal. Mas a neve não é de espuma sintética.

Viemos para a residência de um médico nefrologista. Que casa linda e agradável. Na beirinha do mar que encontra a cidade. Aproveitei a visita para fazer aquilo que mais gosto nessa vida... (subentende-se.)

Na maioria das vezes, escrevo quando estou triste, reflexiva, quando algo dramático me chama a atenção... Mas quando contemplo essas coisas belas, é inevitável: fico sem ar. Meu cérebro não oxigena as idéias. E minha escrita volta aos tempos do primário. Mas afinal, é exatamente assim que me sinto: uma criança diante de um parque de diversões.

É... acho que minha Disney é justamente essa... O frio (de verdade, não o "fake frio " do Brasil), a neve, o silêncio... o café... a lareira... tão, tão... (como dizer?)... breathtaking!
- Mas ainda quero ir a Disney!

Mas agora que estamos aqui (eu e você, Moleskine), creio que partilhamos da mesma opinião: Aqui não tem castelos, príncipes encantados, feiticeiras, magia... Mas é tudo o que eu idealizei em uma aspiração de princesa na torre!

Ai, meu Brasil... eu até gosto de você... mas todo o seu sistema me faz tão, tão triste. Eu queria muito que todo o seu potencial fosse aproveitado... Aí sim, iríamos ver...
Lembro-me dos versos de Vinícius: "Vontade de mudar as cores do vestido (auriverde!) tão feias/ De minha pátria, de minha pátria sem sapatos/ E sem meias pátria minha/ Tão pobrinha! (...)"

Como estamos longe... Como me dá raiva, dói-me os ossos ver como somos humilhados pelos detentores do poder... Como somos enganados, como ficamos contentes por pouco...
Por um instante lembro-me de quando colocaram bebedouros novos na UnB... fiquei contente... Mas gente, o que é um BEBEDOURO diante de tantas outras coisas???

Por isso não me sinto mal em querer trocá-lo. Não me sinto mal em sonhar com minha diáspora. Sabe... a terra do Tio Sam tem sabor de leite e mel.

Quem sabe um dia? Hein?
Quem sabe um dia...

Em um mês eu acordo... volto ao meu Egito... ah... somos tão castigados por essas farsas e mentiras que nos apresentam...
Mas eu sei, Brasil. Eu sei. Como NOSSA gente, NÃO TEM IGUAL!

Sou brasileira de pai, mãe e registro geral...
Mas meu coração não possui territórios demarcados...
Vinícius também diz, nos versos de Pátria Minha: "Porque eu te amo tanto, pátria minha, eu que não tenho/ Pátria, eu semente que nasci do vento (...)"

Meu Reino não é aqui.
Mas por enquanto, posso sonhar...

LT


Diário de Bordo - 1

26 de fevereiro

* Em algum lugar do espaço aéreo *

Acho que ainda tenho algumas horas de voo.
Já comi. Já fui ao banheiro. Peço água.
[pausa]

E chegamos ao mar do Caribe.
É simplesmente lindo.
A Criação é linda.

E eu sou apenas uma única luz acesa nesse voo vazio.

Ninguém ao meu lado.
-Eu e Deus- e as letras enxeridas.

O que me esperará quando o mar acabar?

Eu não sei. Mas sempre tive sede pelo desconhecido. Sempre quis novos ares.

E apesar de ser uma pequena dona de uma pequena janela dentre todos os aviões que dividem o mesmo céu, daqui avisto o mundo inteiro...

Que pra mim, é todo meu.
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27 de fevereiro
*Espaço aéreo de Massachussetts*


Assim que cheguei em MIA, umas 5 pm, peguei algumas informações e fui de ônibus a Miami Beach, apreveitar as horas que tinha na cidade.
As pessoas me indicaram um lugar bem badalado, muitos restaurantes, bares, boates, lojas...
E eu com 30 kg de mala!
Mas quem tem boca vai a Roma, e quem fala inglês então, vai ao mundo inteiro. E Deus manda seus "anjos".
Um moço muito gentil me mostrou um hotel que guardava malas - a nenhum custo, só a gorjeta (que foi paga pelo moço). Ele ainda me mostrou os melhores lugares para ir, onde deveria pegar o ônibus de volta ao aeroporto, etc. Rodei o local todo, mas creio que estava em desvantagem por ser noite. Não achei grande coisa, sinceramente.
Mas foi uma aventura!

E aí veio a noite "maledita"!
Nada aberto em um dos aeroportos mais movimentados dos EUA!
Foi uma das noites mais horríveis da minha vida.
Sem lugar pra dormir, sentei em uma cadeira de espera às 12 am e aquela madrugada não queria dar lugar ao dia.
-Sobrevivi.

No meu voo pra Chicago, outro anjo apareceu.
Conversamos bastante, e ele me fez uma propaganda tão grande de sua hometown, que agora é questão de honra: na próxima oportunidade, tenho de conhecer Chicago!
Pedi licença e tirei um cochilo. O moço também, então nem fui tão mal-educada assim!
Acordei.
O céu estava completamente branco. Não via nada. E o piloto anunciava o pouso.
"Mas cadê o chão? Não vejo nada!" - pensava, aflita.
Ajustei o assento, fechei a bolsa, afivelei o cinto... E assusto-me quando avisto de repente os pinheiros salpicados de neve, a cidade toda "algodoada"... e os flocos de neve caindo lentamente, como se acenassem para mim: "Bem-vinda, Lorena! Esperávamos por você! Que bom que chegou..."

O moço me levou para o local exato para eu pegar o voo para Boston.
E enquanto não chamavam meu voo, sentei-me à janela, contemplando toda aquela alva imensidão, observando curiosa o formato dos floquinhos que caíam desse céu de fevereiro.

E tive certeza:
Estavam ali para me receber.

Desabafo - Sem ofensas

RESUMO

Dia 10 de dezembro de 2012

ABSTRACT
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Foi então que naquela palestra eu tive um insight:
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Eu não quero a Academia.

INTRODUÇÃO

Ela se oferece toda faceira: o glamour do vocabulário difícil, léxico impecável, gesticulações performáticas, diálogos prolixos, quase um dialeto à parte, o qual os pobres graduandos, as abelhinhas operárias desse universo, encaram de olhos semi-cerrados, alheios.

Eu não quero a Academia.

JUSTIFICATIVA
Tem um caminho aberto e me aventurei no primeiro degrau.
Que escolha! - Agora agüenta.
Gaste os olhos, atrofie os punhos.

Mas eu não quero a Academia.

Já quis. Não quero mais.

OBJETIVO
Não quero mais óculos moldurados, não quero calvície, não quero comer salgado com coca no almoço. Não quero dormir às 3h da manhã, não quero me corresponder via online. Quero ser "gente normal".
E pra mim, antes ser gente normal do que ser doutora.

1. PROBLEMÁTICA
Se a Academia de fato insistir, bater com impaciência à minha porta, jurar-me céus e terra e assim conseguir  persuadir-me, creio que estarei finalmente presa na armadilha desse mundo "titular", longe, longe das asas livres do desconhecido.

Não, Academia! Eu não te quero!
Não quero beber do seu café, nem inalar da fumaça espessa do cigarro de seus comparsas.

2. RESOLUÇÃO
Eu quero mente ocupada de meus próprios projetos, uma folha branca e uma caneta para ser doutora de mim.


3. CONCLUSÃO
Não quero placa com letras douradas na porta se ela não me trouxer sono, lazer, família, fins de semana.

-E por favor, não insista: não vou te responder o que é ser gente normal.

Outono

Daqui da mesa onde sento
A vejo majestosa
Recebendo em sua copa o vento
Com sua graça frondosa

Suas folhas, verde-vivas, já começam a mostrar
As marcas que só o tempo é capaz de deixar
De seus sulcos se esvaem o vigor
Ocre-amarelando todo o seu verdor

Há quem passe e a julgue triste
Mal sabendo que dentre todos os seres vivos
Mais sábia que o ser humano criatura existe

Pois sabe que o envelhecer é apenas o prelúdio
Das flores que a esperam na próxima estação
E os que agora a enxergam nua, com repúdio
São os mesmos que na primavera lhe prestam admiração
____________

Ora se não é este o mesmo vento
que balança nossos cabelos,
Embranquecendo-nos as têmporas,
Enrugando-nos o rosto,
Enrijecendo-nos os dedos?

Qual a flor que desabrocha numa tarde primaveril,
Tal é a beleza do que aprende na idade senil
Que não importa quão fundas as marcas do tempo,
Sabedoria é a mais bela das flores plantadas pelo vento

É só deixar-se levar por ele...

O mesmo que agride
É aquele que enfeita
E existe lei da Natureza mais perfeita?


LT,
Em um dia chuvoso de verão.

Manifesto

Resolvi quebrar a rotina hoje.

Saí da UnB a pé até a L2, peguei uma zebrinha e, depois de muito labirintar pelas tesourinhas e sacudir com as freadas bruscas do motorista apressado, cheguei ao meu destino - Brasília Shopping.
Não, não era para estar aqui. Era pra eu ir pra casa, era pra eu fazer trabalhos da faculdade. Mas não. Hoje não.

Não volto pra casa sem respostas.
A interrogação não é uma boa companheira de viagem. Com esses ônibus daqui de Brasília, até eu chegar ao meu destino, os saculejos já a transformariam em reticências.
E isso não é bom. Não mesmo.
Melhor a dúvida do que o conformismo. E vim pra esse shopping dar um basta nisso com uma xícara de café.

Antes do café fui almoçar.
"O que temos aqui para uma pobre estudante universitária que tem menos de R$30 na conta?"
SUBWAY. E eu quero o Baratíssimo.
- Moça, o nosso forno quebrou. Pode ser frio?
Argh... Olho em volta e vejo que não tenho opção mais rentável.
- Bebida?
Não. Vai no seco mesmo. Desce com a água que trouxe de casa.

Outro Everest é achar um lugar pra sentar. Todo aquele universo de roupas sociais, crachás e salto alto preenche todas as mesas com assuntos do trabalho.
Afinal, o que eu estava fazendo ali? Minha pobre pastinha contendo meus alfarrábios e meu jeans rasgado eram incoerentes com o ambiente.

Encontro um assento livre, coincidentemente ao lado do repórter do Globo Esporte. Finjo que nunca vi mais gordo.
E ali, com meu sanduíche frio e minha garrafa de água quente, observo o movimento embalado pelos saltos-agulha no porcelanato, o tilintar dos talheres nos pratos e os assuntos cruzados em uma melodia de colméia.

Nesse local, onde se reúnem os executivos da capital, é intervalo de expediente de servidores públicos, jornalistas, empresários, advogados e outros profissionais cujos ofícios exigem gravata e colarinho. Sinto-me "despertencida". Aliás, passo a me questionar.
"Se tivesse escolhido essa vida, hoje iria almoçar comida japonesa." Quem sabe até teria um carro. Usaria maquiagem com mais frequência. E salto alto.
Ou simplesmente não seria eu.

Escolhi - e me arrepio em admitir - o árduo caminho das letras.

Olho para a moça elegante ao meu lado, que acabou de dizer que já se mudou para o próprio apartamento - uma conquista gloriosa, se tratando da capital do país - e lhe digo com os olhos: "Eu escolhi esse caminho. Eu escolhi esse jeans rasgado. Mas estou bem certa de que em meus alfarrábios constam objetos de tal/qual valor: as letras."

E eu posso até ser aquela que dizem ser "sem eira e nem beira".
- Mas não me importo com a arquitetura de prestígio.

Meus tijolos são os verbos, o cimento faço de conjunções e preposições. Minhas colunas, os pronomes. Dos artigos faço as telhas da edificação. O acabamento é a inspiração...
Meu leito é feito de papel e o nanquim mantém a casa de pé.

Eu escolhi morar lá.
Pode não ser um lar como o da moça da mesa ao lado, mas pelo menos não pago imposto nem aluguel.

A interrogação ainda insiste em assombrar-me os pensamentos. Mas só tenho dinheiro pra uma passagem. Não preciso dela para erguer a minha casa. Geralmente a transformo em gancho onde penduro as frustrações e arrependimentos. Mas agora resolvi que vou deixar a interrogação em desuso.

Nesse café onde eu paro para a digestão do almoço modesto, histórias se cruzam, recebo ligações, verto lágrimas, desemboco sorrisos. Encontro com a resposta.

Não uso crachá porque trabalho pra mim. E mesmo com - agora - bem menos de R$30 na conta bancária, acho que posso ter bem mais motivos pra sorrir que a moça da mesa ao lado. Ou o repórter da Globo.

E me deparo com uma certeza que tenho na vida: entre salto alto e apartamento na Asa Sul, eu escolho é ser feliz.
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LT
06/02/13
15h

Janeiro 10, 2013


E um novo ano se inicia.

Mais um ano de pensamentos reclusos, pulsos oclusos, lábios obtusos e papel e caneta inclusos.

E mãos à obra, não é assim?

É dia de viver, de lutar, de conquistar... Todo dia é dia.

E é assim que ele começa...

Com um bom capuccino, caneta nanquim, moleskine vazio e
a cabeça cheia de sonhos e
ideias.

Vamos viver o 2013
vamos viver os próximos,
se ainda restar um sonho,
vamos viver!

LT

quantos anos cabem em 365 dias?

e foi caverna e foi luz e foi luto e foi luta e foi corpo velado e foi sorriso velado e foi vela no bolo e outra no caixão e mais uma, e mai...